Exposições
O Fio de Ariadne | Dani Soter
Sobre o autor
Dani Soter (Porto Alegre, 1968) é formada em Letras pela Universidade de Paris, Sorbonne. Seu trabalho pessoal faz parte do acervo da Maison Européenne de la Photographie (Paris) e mereceu o Prêmio Especial do Júri da VII Photographic Exhibition (Pequim, 1998) e da 9ª Bienal de Artes Plásticas de Santos (São Paulo, 2004). É a criadora e curadora, juntamente com Cláudia Tavares, do projeto Figura (fotografia e arte contemporânea), atualmente na sua nona edição. Em 2005, expôs na Mínima Galeria de Arte, no Rio de Janeiro, e no Palais de Glace, em Buenos Aires, além de ter participado de coletivas no Centre International d’Art Contemporain, em Nice (França), e no Museu da República e no Centro cultural parque de Ruínas, no Rio de Janeiro.
Texto crítico
Existe uma história subterrânea das artes, que se inicia com a consolidação da perspectiva central na Renascença e que desagua no Impressionismo e na invenção da fotografia no século XIX e seus desdobramentos no século XX, que é a história da distância. Nessa seqüência de séculos a arte buscou aproximar-se cada vez mais da exterioridade, diminuindo a distância entre o objeto da representação e a imagem representada. Esse desejo de aproximação provocou a emergência de outras camadas de visibilidade. Determinados aspectos da realidade, que antes nos eram interditados – como o micro e o macro cosmos – passaram a fazer parte do nosso acervo visual. Mais do que novas imagens, estas imagens solicitaram de nós uma outra maneira de ver – em que a medida da perspectiva se perdeu – e fez emergir um novo código de interpretação, que não se adequa mais à forma usual de surpreender a imagem a partir de um ponto de vista único, imóvel e linear, tal como determinado pela tradição da perspectiva central. Entre o olhar que domina a profundidade do espaço e o que anula a distância, surgiu um território de dubiedades que confunde a visão e cria imagens ambivalentes.
A inteligência plástica de Dani Soter faz emergir este território como expressão poético-metafórica da nossa condição atual. As fotografias de Dani nos confundem porque elas foram feitas para provocar nossa capacidade de percepção de adequação entre a imagem e o que ela representa. Elas buscam a ambivalência como forma de expressar a crise de identidade que vivemos. Ora somos um, ora somos uns. Ora vemos uma carta celeste, ora vemos fragmentos de corpos. Essa alternância revela um mundo em que a idéia de identidade está se desfazendo. A nostalgia da identidade é conservada pela linha vermelha que costura interligando os pontos como se quisessem revelar a direção de um sentido: uma nova constelação criada a partir de sinais dos corpos. Há ousadia na obra que Dani Soter está construindo. Ela não teme ir ao encontro desse território movediço em que as certezas se desfazem. Ao contrário, cria uma estratégia visual, para enfatizá-lo. Aceita esse momento de passagem entre realidades que estamos vivendo e aceita o risco de não oferecer certezas que acalmariam nosso olhar e apaziguariam nossas almas. Entre um e uns: os reais.
Marcio Doctors
Poderíamos falar de revelação de uma outra dimensão do cotidiano, de um lado oculto, maravilhoso e tenebroso, onde o risco de se perder vale a conquista de se achar como ser. E, para ajudar no caminho de volta de si para si, aí está o fio de Ariadne, de Dani Soter. Explícito, bordado ou fluido, a escorrer por ralos raros na sua banalidade, às vezes refletido e fugidio, o vermelho – sangue, desejo, vida – nos guia por ambigüidades que diluem as fronteiras de ser, revelando o que também poderíamos ser. O que é, aí, não é mais apenas o que é por fora e para todos. É, sobretudo, o que é por dentro e para cada um.
Milton Guran