Exposições
Díptico | Simone Cupello e Victor Haim
Sobre o autor
Simone Cupello é graduada em arquitetura, frequentou cursos de cinema na Espanha, na Itália e no Brasil. Em seu trabalho, opera fotografias, imagens de cinema e vídeo criando narrativas através de usos não convencionais e do deslocamento do lugar do observador.
Victor Haim, desde cedo, transformava coisas antigas, quebradas, em outras coisas. Essa obsessão pela transformação perdura até os dias de hoje. Trabalhou em importantes montagens de peças teatrais, em Curitiba, Rio de Janeiro. A partir de 2002, começa a trabalhar com a câmera digital portátil e seus recursos de macro, encontrando no micromundo um fértil canal de expressão.
André Sheik, curador, é poeta, músico, compositor, redator, curador independente. Curador de diversas exposições individuais e de coletivas. Desde 1999, expôs em mostras em Portugal, França, Polônia, EUA, Suécia, Bolívia, Venezuela, Colômbia, Cuba e Brasil. Participou, como convidado, de seminários na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), ministrou oficinas na Universidade Federal Fluminense (UFF), no Ateliê da Imagem (RJ) e no Museu de Arte do Rio (MAR).
Texto crítico
Nenhum tipo de imagem dá conta do real. A fotografia é uma construção, um recorte. Não é a realidade, tampouco registro dela. É uma perspectiva da realidade. A fronteira que tangencia o olhar do outro e o do autor é o que define uma obra. Os dois artistas desta exposição esgarçam a tensão entre uma representação e o nosso entendimento de mundo.
Se você sabe o que é real e o que é fantasia, você não existe.
Um díptico é um conjunto de duas obras do mesmo gênero, que se completam. Embora com trabalhos visualmente bastante distintos, Victor Haim e Simone Cupello trabalham com construções escultóricas; Victor prepara os cenários que fotografa e Simone aglutina fotos tridimensionalmente no espaço, e a maioria das obras de ambos presentes aqui chamam a atenção para a superfície, parte exterior e visível de algo. As imagens apresentadas não estão em um tempo de deslocamento entre o percebido e o imaginado. Os trabalhos expostos demandam que o olhar se fixe na imagem e que o cérebro analise cada uma pelo que está ao alcance do olho. Não há um convite imperativo a fabulações, a despeito destas serem sempre possíveis.
Ao sol do meio-dia, não sou mais que sombra
Quando há mais luz, é que fico cego
Simone utiliza como matéria de modelagem fotos que adquiriu de diversas maneiras, e que são provenientes de arquivos privados de pessoas que desconhece. Ela “apaga”, quase que totalmente, os rostos e corpos, o entorno e o contexto e as histórias dessas fotos. Assim, nos incita a olhar a materialidade da fotografia: o pigmento, o papel, seu verso, sua borda, os limites entre mundo e imagem. Já Victor “retira” qualquer vestígio de subjetividade da fotografia ao registrar imagens de cenas – cuidadosamente preparadas por ele – descoladas de explícitas referências exteriores. São como pequenos mundos imaginários, que só se concretizam e são possíveis quando impressos em suas fotos, e que têm a sua irrealidade acentuada pela iluminação dramatizada que enfatiza os contrastes entre luz e sombra. Nos dois casos, nessas suspensões operadas pelos artistas, há uma fricção entre materialidade e imagética.
Uma miragem materializou-se em seus olhos…
Você não vê que o que vê é o que há?
A visão é uma construção do cérebro, o aparelho óptico humano apenas capta a luz, não interpreta, assim como a câmera. Nesse aspecto, a imagem fotográfica é uma realidade em si. “A arte não reproduz o que vemos; ela nos faz ver”, disse o pintor Paul Klee. É difícil olhar para uma fotografia e não fazer relações com o entorno e, até mesmo, com o nosso interior, pois o cérebro faz conexões. Entretanto, existe um local próprio da imagem, que é apenas vislumbrado, pois é inacessível: nossos olhos não o captam, nosso cérebro não o interpreta.
Entre o ser e o sonho
Aí está você
Como perguntou Chico Marx: “em quem você vai acreditar, em mim ou em seus próprios olhos?”
André Sheik, maio de 2015.